Tuesday, May 31, 2011

Larguei o Cigarro

Ao andar pelas ruas das grandes cidades, impressiona-nos o crescente número de fumantes, dependentes químicos e psicológicos do cigarro que arruínam a própria saúde e formam um grande contingente que é um peso para a saúde pública e o sistema previdenciário, com graves conseqüências sociais e econômicas. Segundo as estatísticas, os jovens estão fumando mais, as meninas especialmente. Apesar das restrições à propaganda, o vício vai se alastrando descontroladamente.

No dia primeiro de Maio de 1998 parei de fumar. Um grande final de uma brincadeira que durou mais de trinta anos. Estava por completar 50 anos e resolvi dar um golpe fatal naquele hábito horroroso com o qual não me conformava desde que o adquirira na década de sessenta. Naquele tempo todo mundo fumava, era chique, bonito, apreciado. Nos tempos de cursinho e faculdade, nem se fale!

Comecei filando do meu pai que deixava o maço em casa e só fumava um cigarrinho depois do cafezinho. Depois comecei filar dos amigos, e um dia comecei a comprar. Fumava pouco, mas fumava.

Quando tinha uns vinte e poucos anos descobri que por detrás do hábito havia um pensamento em minha mente que o representava e que precisava ser controlado para não crescer demais. E foi o que fiz; cuidei dele, mas não o matei de fome, do que me arrependo, mas em tempo o fiz, com quase cinqüenta anos.

Quando larguei, descobri que além do hábito representado por aquele pensamento, havia uma dependência química, os anticorpos que pediam a dose diária de nicotina e que em 15 dias de abstinência foram eliminados do organismo. E como o pensamento estava fraquinho pelo combate que travei durante aqueles longos anos, venci a batalha sem remédios nem apoio psicológico, com minha própria vontade!

Foi uma longa e árdua luta como tantas que devemos travar com certos pensamentos estranhos e que têm vida própria em nossa mente e acabam por mandar em nossa vida.

Como escreveu certa vez o educador González Pecotche, vivemos num mundo onde imperam os pensamentos. Temos a impressão de sermos os donos de nossa vida e de nosso destino, mas na verdade somos levados de lá pra cá por pensamentos estranhos, exóticos, ditadores.

Como muito bem explicou-nos noutro dia o amigo Antonini, a mente do ser humano assemelha-se à uma praça pública com uma multidão de pensamentos de toda índole que por lá perambulam num burburinho e numa desorganização sem precedentes.

Qualquer mudança naquele ambiente deve começar por ordená-la e organizá-la, identificando os transeuntes e selecionando aqueles que podem servir. Uma espécie de estado de sítio mental subordinado à autoridade de um pensamento central.

Reverter a condição humilhante em que a maioria das pessoas vive, escravizadas por pensamentos alheios e estranhos à própria vontade e realidade, é uma tarefa cujos resultados são infinitamente superiores ao esforço empreendido.

Nagib Anderaos Neto
www.nagibanderaos.com.br

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Wednesday, May 25, 2011

A Fé Em Si

Fechar os olhos para a realidade e acreditar na ficção que criamos ou que nos é imposta constitui a verdadeira e maior cegueira.

Saber significa ver a realidade, penetrar em sua superfície e aproximar-se da verdade. Tem muito a ver com sabor, experimentação, comprovação; significa liberar-se da cegueira da ilusão; afastar-se de tudo quanto se oponha à realidade, à verdade. Não pode haver outra fé que não seja em si; ninguém haverá de resolver por nós o que nos incumbe. A fé no que se ignora implica submissão; por esse motivo, os tiranos são hábeis em inventar mentiras para submeter pessoas humildes, simples e tristemente adjetivadas de boa-fé.

O autoconhecimento deve implicar o afastamento das ilusões que se avolumam e nos levam às desilusões que muito têm a ver com a depressão e a tristeza. Aprender a viver próximo da realidade é uma forma de estar junto da felicidade.

A vida se amplia quando nela colocamos muitas atividades com possibilidades de realização. E se algum fracasso sobrevier – coisa que invariavelmente acontece -, ele pode se transformar na base de um futuro acerto. O essencial é procurar estar sempre muito próximo da realidade.

Os problemas que enfrentamos são criados por nós: falta de previsão, ilusões e ignorância. A felicidade pode estar muito perto e não a estarmos vendo pela cegueira que nos impede contemplar a vida, as pessoas e o mundo com outros e novos olhos que reconheçam em seus detalhes os verdadeiros momentos de alegria e felicidade: um amanhecer, uma amizade, um pequeno aprendizado, pois viver deveria ser um grande motivo de alegria.

Aquilo que não se compreende não se possui, escreveu certa vez Goethe. A compreensão implica apreensão total, posse, integração de um fragmento de verdade ao patrimônio pessoal. Uma ilustração interior, culminação fruto de um processo no qual a inteligência e a sensibilidade participam. Um fragmento de verdade pode ser vislumbrado pela intuição, mas deverá ser confirmado pela razão para que faça parte do patrimônio individual. Se não se confirma, propende-se à fé cega, anulação da inteligência, falência da mente e do espírito. O que se compreendeu implica uma fé consciente fruto da comprovação da verdade pela razão. A compreensão é de índole espiritual; acrescenta ao espírito o que lhe falta. Nada tem a ver com a ilustração do intelecto, senão com a formação do espírito individual.

A necessidade espiritual - o vazio interior, fome por verdade e conhecimento - existe em todos. Uma fome que tem sido alimentada com o pão amanhecido da ilusão e da tergiversação.

A fé no futuro deveria significar a fé em si pelo que se é capaz de fazer pela vida, fé consciente que se chega pela compreensão, posse gradativa de fragmentos de verdade que se obtém no decorrer de um processo, liberação espiritual que somente o indivíduo pode fazer por si.

Nagib Anderáos Neto
www.nagibanderaos.com.br

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Monday, May 02, 2011

Afastando a Depressão

Recentes pesquisas relacionam senilidade com vida rotineira. Fazer tudo sempre da mesma maneira entorpece a livre manifestação da inteligência tornando os movimentos mentais muito lentos pelo desuso, da mesma forma que o sedentarismo leva às restrições físicas. A mente, como o corpo, deve exercitar-se fugindo da rotina, criando novas atividades.

A rotina traz a depressão, o vazio e a tristeza, fracassando a capacidade de iniciativa e submergindo a pessoa no marasmo do tédio e na desconfortável sensação de inutilidade. Aproveita-se o tempo fugindo dela, rompendo com os hábitos, as mesmices, os preconceitos; ganhar tempo é ganhar vida pela renovação.

Ao agir mecânica e rotineiramente, não se pensa no que se faz, vive-se distraída e esquecidamente. É necessário criar o hábito de pensar, aperfeiçoar o que se faz e colocar novas atividades na vida. Não sejamos como Sísifo, o trágico herói mitológico condenado a realizar por toda a eternidade um trabalho inútil e sem esperança. Ele fora condenado pelos deuses a empurrar sem descanso uma enorme pedra até o alto de uma montanha de onde ela rolaria encosta abaixo para que o absurdo herói descesse em seguida até o sopé e empurrasse novamente o rochedo até o alto, indefinidamente, numa repetição monótona através dos tempos. O inferno de Sísifo é a trágica condenação de estar empregado em algo que a nada leva. Ele amara a vida e menosprezara os deuses e a morte. Por tal insolência fora castigado a realizar aquele trabalho inútil. Sua rebeldia poderia ter sido motivo de admiração pela insurgência contra o espectro da morte e o poder dos deuses, mas foi castigado por uma justiça duvidosa.

Não seríamos todos Sísifos? Não estaríamos empenhados num grande esforço e sacrifício que poderiam não estar levando a nada como o sisifismo mitológico? Talvez nosso trabalho seja uma condenação e a vida uma tragédia rotineira, e Sísifo, num lampejo de consciência, tivesse reconhecido o peso de seu infortúnio representado pelo enorme rochedo da materialidade e da inutilidade; considerado que se assemelhara ao rochedo, e que seria necessário reverter aquele processo monótono, mudando a rotina absurda de dias, anos e séculos. Preso, no entanto, à mitologia, criado que fora para cumprir aquela finalidade pedagógica, nada pudera fazer. Ele prosseguiu no seu tormento para que pudéssemos superar o nosso. É um herói trágico e absurdo.

Para o homem existe a possibilidade de modificar a rotina tediosa e lançar ao longe o rochedo das misérias, da ignorância e da inconsciência; deixar de repetir os dias, os anos e as vidas sem variação alguma para construir um destino renovado. A pedra de Sísifo tem hoje outros nomes e é inútil o trabalho de erguê-la. Deixemos que o rochedo role ladeira abaixo e que ele prossiga como mito. Pensemos que poderemos superar aquele trabalho rotineiro modificando a vida, o presente, o passado e o futuro. Transformemos a vida renovando e aperfeiçoando os pensamentos, criando novas atividades e superando as condições pessoais.

Tudo deve mudar na vida, e mudar para melhor. Se não se pode alterar os desígnios de uma Vontade superior que determina um tempo para ela, a trajetória dos astros e o ritmo do Universo, há um amplo espaço de liberdade para se movimentar, desde os obscuros níveis da ignorância até as alturas inefáveis do conhecimento. Para mudar é necessário querer. E saber aonde se quer chegar. Querer é poder, literalmente, pode nada significar. Saber é poder.

Diante dos momentos difíceis que a vida apresenta, sentimos a necessidade de mudá-la, transformando-nos: hábitos, maneira de pensar, pensamentos. Por mais cultura que se tenha, percebe-se que algo falta: um conhecimento que habilite a ser artífice do destino; isto as escolas não ensinam. Ignorando os meios que poderiam tornar a vida melhor, corre-se o risco de ser, a cada dia que passa, uma pessoa pior. O fato de se querer muda-la não significa nada se não sabe como fazê-lo. Seria indispensável aprender a pensar e a mudar a natureza dos pensamentos que há na mente. Onde está esse conhecimento?

Muitos são os que andam em busca da panacéia universal, os que entregam seus problemas e intimidades a conselheiros duvidosos caindo no mutismo cético da desilusão. É possível que a resposta que buscaram ingenuamente por todas as partes estivesse escondida neles próprios.

Saber é poder. E quando não se sabe, é necessário procurar quem ensine a caminhar na direção do conhecimento, pois ele não se dá em pertinência, deve ser conquistado. O que pretende respostas prontas, conhecimento sem esforço, solução imediata para os problemas pessoais, acaba por engrossar a caravana dos iludidos, sempre prontos a se alimentar com o pão amanhecido e duro da tergiversação.

Saber ou não saber, eis a questão. A prerrogativa de ser existe. E como se chega a ser o que não se é? Como se chega a saber o que não se sabe? O que se quer saber? O que se quer chegar a ser? Uns querem ser ricos, outros admirados. Uns querem ser doutores, intelectuais, reconhecidos. E todos começam não sendo nada. E quando chegam a realizar os sonhos mencionados – e são muito poucos os que o conseguem – percebem que aquilo era pouco, não era o que imaginavam. Tudo fica parecendo um brinquedo velho, sem graça, imprestável; e volta-se ao ponto de partida. As reflexões básicas de Hamlet adquirem uma nova dimensão: o que eu quero ser? O que eu quero saber? O que preencheria o vazio da minha alma?Nesse momento, a reflexão sensata leva o indivíduo a voltar para si e encarar a realidade; não aquilo que se esforça por aparentar, mas aquilo que realmente é: uma pessoa eventualmente ilustrada, mas pouco provida do conhecimento essencial, pois pouco conhece sobre si, as causas dos desacertos, tristezas, desentendimentos. Descobre que para ser o que não é deve se conhecer para vislumbrar o que pretende. Desenha-se na mente um processo de superação cujo paradigma é ele mesmo e não os outros; que deve buscar ser melhor ao invés de superior aos outros; saber com que recursos conta e o que deve ser aperfeiçoado em sua estrutura psicológica e espiritual. Ser ou não ser? Saber ou não saber? É possível que a reflexão profunda e sincera contenha em sua formulação a resposta.

A vida deve ter um significado. Não se pode deixar que os dias se esterilizem numa sucessão de fatos repetidos e sem importância. Para vencer essa rotina, será necessário assumir o governo dela criando uma autoridade e uma disciplina interiores que conduzam a pessoa para um contínuo aperfeiçoamento; será necessário viver fatos e experiências durante as horas, os dias, os meses e os anos que se constituam atos dignos de uma vida ampla e generosa na qual se possa experimentar a verdadeira sensação de existir.



NAGIB ANDERÁOS NETO
www.nagibanderaos.com.br

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