Monday, March 25, 2013

Ser ou Não Ser




O drama do príncipe da Dinamarca, mais que o conflito familiar e a traição abjeta de um tio usurpador, adquire o contorno angustioso da inquietação humana diante de sua origem e destino. O espectro do pai assassinado, a ingênua mãe amparada pelo tio assassino e a loucura fingida de Hamlet nada mais são do que a moldura de um quadro mais complexo pintado com as sombrias tintas das dúvidas existenciais de todo ser humano.



Consta que Shakespeare teria extraído o mito de Hamlet de uma antiga lenda escandinava contada por Saxus Grammaticus, um dinamarquês do século XII. A peça foi registrada em 1602 e impressa em 1603. O rodar dos séculos, no entanto, não tornou o drama anacrônico; pelo contrário, é atual por conter questões não resolvidas no decorrer deste enorme tempo.



Ser ou não ser? Morrer, ou simplesmente dormir? Cessariam assim os pesares do coração? Que sonhos poderiam sobrevir após a morte? Por que deveria uma vida calamitosa prolongar-se por um tempo tão grande? Por que suportar os reveses da vida sendo tão fácil concluí-la com as próprias mãos? Seria a consciência que tornaria os homens covardes diante da possibilidade de interromper as contrariedades que se sucedem na experiência da vida?



A consciência humana não poderia tornar o ser humano covarde afastando-o das respostas; não seria então com ciência, com verdade, com conhecimento, seria uma outra coisa qualquer. O dilema, no entanto, persiste: ser ou não ser?



A prerrogativa de ser existe; somente o próprio indivíduo poderá realizá-la.



E como se chega a ser o que não se é? Como se chega a saber o que não se sabe? O que se quer saber? O que se quer chegar a ser?



Uns querem ser ricos, outros admirados. Uns querem ser doutores, intelectuais, reconhecidos. E todos começam não sendo nada. E quando chegam a realizar os sonhos mencionados – e são muito poucos os que o conseguem – percebem que aquilo era pouco, não era o que imaginavam.



Tudo fica parecendo um brinquedo velho, sem graça, imprestável; e volta-se ao ponto de partida. As reflexões básicas de Hamlet adquirem uma nova dimensão: o que eu quero ser? O que eu quero saber? O que preencheria o vazio que habita a minha alma?



Nesse momento, a reflexão sensata leva o indivíduo a voltar-se para si mesmo e encarar a sua realidade; não aquilo que se esforça por aparentar ser para os demais, mas aquilo que realmente é: um ser eventualmente ilustrado, mas pouco provido do conhecimento essencial, pois pouco conhece sobre si mesmo, sobre as causas de seus desacertos, de suas tristezas, de seus desentendimentos consigo e com os semelhantes. Descobre que lhe falta o conhecimento sobre sua pessoa, o conhecimento de si mesmo; que para ser o que não é deve conhecer-se para poder vislumbrar o que pretende ser. Desenha-se em sua mente um processo de superação cujo paradigma é ele mesmo e não os outros; que deve buscar ser melhor que ele próprio ao invés de ser superior aos demais; saber com que recursos conta e o que deve ser aperfeiçoado em sua estrutura psicológica e espiritual.



Ser ou não ser? Saber ou não saber? É possível que a reflexão profunda e sincera contenha em sua formulação a resposta.



Nagib Anderáos Neto

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Thursday, March 21, 2013

A Insustentável Arrogância



Do latim arrogantia, orgulho que se manifesta por atitudes altivas e desdenhosas; soberba, insolência, atrevimento. É o que nos transmitem os modernos dicionários da língua portuguesa.
Mais do que a definição do termo, interessa-nos o perfil do pensamento que está na mente da maioria dos seres humanos.
O que é a pessoa soberba? A sabida? A que gosta de humilhar os outros? A que sutilmente se arroga a uma posição fictícia com o indisfarçável intuito de diminuir os outros? Que se acha esperta e que todo o mundo não sabe nada?
A pessoa extremamente arrogante põe a descoberto um defeito ou deficiência psicológica que, em menor ou maior grau, todos temos: a soberba, oposta à humildade, que insensibiliza as pessoas, faz o chefe pisar no subordinado, o inferior se revoltar contra aqueles que estão hierarquicamente acima dele, mas que quando ascende a cargos superiores se torna mais cruel do que foram com ele. Não é difícil identificar nas outras pessoas este defeito; o difícil é reconhecê-lo em si, porque fomos educados para olhar o que nos cerca sem perceber o que ocorre em nosso mundo interior, na nossa alma; é fácil criticar os outros, mas difícil realizar a autocrítica.
A soberba é irmã siamesa da vingança, da desconformidade. O fato é que ela existe na maior parte das pessoas. É um pensamento que deve ser identificado e combatido, para o nosso bem e felicidade.
Como muito bem apontou González Pecotche no livro Deficiências e Propensões do Ser Humano, “a soberba não tem lugar nas almas grandes nem nos espíritos fortes e bem equilibrados. O soberbo é violento, e sua palavra, lacerante. Agrada-lhe humilhar e depreciar. E, além do mais, ambicioso; aspira ao trono material e não vacila se, para ascender a ele, deve valer de meios pouco dignos e em detrimento do próximo”.
O soberbo é ingrato, incapaz de reconhecer a atenção e a ajuda que outros despenderam a ele. A ingratidão é um dos grandes males dos quais os seres humanos padecem e causadora da depressão e do vazio.
Oposta à soberba é a humildade, virtude que tem a ver com a simplicidade e a naturalidade e que não deve ser confundida com a falsa, tão comum nos impostores fantasiados de bondosos, generosos e mansos, os que escondem em seu íntimo a pretensiosa ambição de subjugar as mentes e as vontades das pessoas tristemente qualificadas de boa-fé.
A soberba, como tantos outros defeitos humanos, afasta o homem de seu semelhante, da alegria, da felicidade.
 Ocupar-se de si, identificando os próprios defeitos com o objetivo de combatê-los, faz parte de uma educação de exceção que escola alguma é capaz de ensinar.

Nagib Anderáos Neto

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