Wednesday, March 02, 2011

Observar e Pensar

O que é observar? Seria o mesmo que pensar, refletir, recordar, raciocinar?
O que se deve observar? O que tem a observação a ver com o entendimento?
E a inteligência, onde fica?
Observar não é apenas olhar, contemplar, senão ver e entender. É uma capacidade da inteligência que pode ser desenvolvida, educada e utilizada para o bem próprio e coletivo. É necessário que um objetivo guie a observação. A palavra inteligência provem do latim e significa capacidade de ler por dentro, penetrar no sentido íntimo do que se vê. Se olho para os rios e os prados absorvendo e aprendendo a calma da Natureza em seu incessante movimento, dei um destino prático à observação porque me espelhei no que vi. Se olho para as paisagens interiores, pensamentos tumultuados e intempestivos que estão na mente e exercito-me na imposição de ordem e disciplina que harmonizem aquelas paisagens, dei um destino positivo para a observação que se confunde com a reflexão, o pensar, a recordação, a inteligência - o sol interior que cada ser humano tem e que pode brilhar mais e mais, libertando-nos da escuridão - , pois o maior cego não é o que não quer ou não pode ver, senão o que não quer ou não pode entender. E os primeiros entendimentos que devemos realizar são os que possamos ter sobre nós.
É difícil julgar as outras pessoas sem antes haver aprendido a exercer o juízo sobre si. Julga-se, em geral, em função de apreciações alheias, pelo que se ouviu dizer, e não pelo que realmente se observou. A observação consciente – conforme nos esclarece o pensador González Pecotche em inúmeros escritos e conferências – deveria servir para corrigir as nossas imperfeições. O que vemos de desagradável na conduta de uma pessoa levar-nos-ia a verificar se não existe em nós aquela característica. Mas o ser humano não sabe olhar para si; olha o mundo como se não fizesse parte dele; vê, mas não enxerga e nem entende que todo aquele cenário está ali para transformá-lo em diretor e ator do espetáculo da sua vida. Ao invés disso, gasta seu tempo admirando ou criticando outras vidas e mundos, esquecendo-se de si, e que dentro dele existe um pequeno universo no qual poderia viver e ser feliz. Essa falha gritante da cultura engendrou nas mentes a tendência ao escapismo; viver fora da realidade, sempre a fugir de si, no trabalho, diversões, estudos, leituras, nas platéias, pois não consegue conectar aquilo que acontece à volta com a sua realidade. Olhar para a Natureza e seguir o exemplo de paciência, movimento, renovação, evolução, e exercitá-lo no dia-a-dia através da capacidade de pensar, criar e se modificar.Ao invés disso, vamo-nos transformando em atores que decoram e interpretam falas escritas por outros que foram atores como nós, repetindo frases e cenas que compõem as tradições que – como disse González Pecotche – são o cemitério das idéias.
Romper com essa inércia é o grande desafio da humanidade no despontar do terceiro milênio. Ao voltar-se para si e educar-se, o homem do futuro transformará o horroroso espetáculo de guerras, corrupção e violência no qual se encontra num cenário condizente com a espécie inteligente que um dia poderemos chegar a ser.
Ao dizer que tudo o que sabia era que nada sabia, Sócrates dá-nos a pauta de uma conduta, caso queiramos aprender e evoluir. Será necessário arrancar a máscara da personalidade que nos leva a aparentar aquilo que não somos, mas que imaginamos. Se ela não estiver aderida à epiderme psicológica, poderemos iniciar o caminho para construir a individualidade.
Já se disse que os homens são livres, mas não o sabem; nascem livres e vão perdendo esse dom que lhes fazia sentir imortais, verdadeiros super-homens naquele formidável universo infantil. Esse seria o tão bem guardado segredo dos tiranos, o fato de saber que os homens podem chegar a ser livres novamente, mas não enxergam isso, transformando-se em escravos nas mãos daqueles déspotas.
A liberdade é um dom que, se não utilizado, pode desvanecer-se, da mesma forma que a inteligência e a sensibilidade humanas.
É comum ouvir-se dizer que o ser humano usa um quase nada de sua capacidade mental; que uma mente preparada poderia realizar verdadeiros prodígios. Por que isso acontece? Por que a mente humana é pouco utilizada? Quais as causas dessa deficiência? O que fazer para tornar a mente mais eficiente?
Essa falta de liberdade é como um cárcere cujos barrotes são o temor de pensar por própria conta, os preconceitos, a ignorância sobre si e as Leis que regem o Universo.
Todos querem a liberdade, trazem-na dentro de si como algo que não se realiza, e, no fundo, sabem que o ser humano não deve curvar-se perante poderes quaisquer.
Se o homem, como diziam os gregos, é a medida de todas as coisas, por que vive tão esquecido de si, tão ausente, entretido com o que não é essencial por ser passageiro e efêmero?
A verdadeira liberdade é a de pensar. É assim como o espírito humano respira,criando,tendo um domínio sobre os pensamentos que perambulam por aí fazendo os estragos que sabemos quais são.
Ser livre é usar com liberdade a inteligência, suas faculdades, e não somente a memória e a imaginação,como nos têm pretendido impor aqueles que nos querem manter atados às rédeas da submissão. Os tiranos, os ditadores, os inimigos da liberdade não querem que o ser humano pense, porque tal grito de liberdade é a ameaça ao poder que as ânsias de domínio desenham em suas mentes doentias.
Pensar, observar, raciocinar, refletir, combinar e julgar são algumas faculdades da inteligência que não têm sido muito exigidas e desenvolvidas pelo ser humano pode deixar de ser joguete e escravo de pensamentos alheios que nada têm a ver com a felicidade almejada pelos que sonham com a liberdade.

Nagib Anderaós Neto
www.nagibanderaos.com.br

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