A Casa de Papel
“Ao vovô, cujo destino é a Emily, e cuidado ao atravessar a rua“, dizia a dedicatória do amigo Ono ao me presentear a Casa de Papel de Carlos María Domínguez, obra mágica cujo narrador descobre que os livros podem ser perigosos, por mudar o destino das pessoas; e que a biblioteca que se forma é uma vida, muito mais que a somatória de livros soltos.
Bluma Lennon, colega do narrador e professora de literatura, é atropelada e morta no Soho enquanto lê um poema Emily Dickinson em voz alta ao atravessar uma rua movimentada. Inicia-se uma trama detetivesca. Depois de sua morte ela recebe um misterioso exemplar de A Linha da Sombra de Joseph Conrad vindo do Uruguai e salpicado de cimento.
A Casa de Papel fala de livros que mudaram destinos, como Sidarta, os de Hemingway, Dumas, Balzac, Faulkner. E lembraríamos Lobato, Zweig, Amado, Clarice, Borges, Mishima, e tantos outros encantadores de palavras.
A pequena obra nos reporta à Buenos Aires, paraíso de livrarias, e à magnífica Avenida Santas Fé com seus cafés e à majestosa Ateneu onde se pode perder de felicidade em meio a tantos livros, tanta vida e tanta história.
Fala também de Piglia, outro argentino, e de Borges, bússola moderna dos que lêem e escrevem. E da desordem dos apaixonados por livros, prateleiras repletas e poeirentas, da falta de espaço, de tempo e de dinheiro para se transformar no leitor que se sonhou ser.
Assim é a Casa de Papel que um dia cada leitor construirá feita de livros, sonhos e esperança, onde o leitor acaba por se transformar em escritor, e este em autor. Onde o homem solitário se encontra nos livros, decifrando sua vida nas palavras, naqueles mágicos objetos um sentido, como o Quixote, para quem a vida seguira um roteiro de livros lidos, ou Hamlet, que entra em cena lendo um misterioso livro, ou fingindo que lia, ou como o poeta Chinês Yan Tsen-tsai, que na noite fria, absorto na leitura de seu livro, esqueceu-se da hora de deitar e da bela companheira de leito que dominando sua ira lhe perguntou: Sabe que horas são?, no poema que Kafka copia e envia para a amada secretária Felice Bauer.
Mas qual poema misterioso estaria Bluma Lennon lendo ao ser atropelada?
“A palavra é morta quando é dita, alguns dizem. Eu digo que ela começa a viver naquele dia”.
Com este poema simples, a introspectiva Emily atravessa o tempo e atinge os corações e as mentes reflexivas.
O que é a palavra? Ela vive? Ela morre? Sobrevive a quem a pronunciou? Qual mistério a envolve e substancia? Qual a sua força?
O mistério da palavra é o mistério do pensamento. Ela é a expressão física deste e pode desaparecer. Ele não. O pensamento pode cruzar o espaço e o tempo e sobreviver como espírito, como chama, como sopro. Desaparece o som, a voz, fica o sentimento, o sentido, a raiz, a intenção, a emoção.
Assim é o homem-voz, expressão de um pensamento maior, anterior ao som e à palavra, misterioso arquiteto e habitante de uma Casa de Papel repleta de livros, histórias, idéias, biblioteca formada que é toda uma vida, muito mais que uma soma de momentos soltos.
Nagib Anderáos Neto
www.nagibanderaos.com.br
neto.nagib@gmail.com
Bluma Lennon, colega do narrador e professora de literatura, é atropelada e morta no Soho enquanto lê um poema Emily Dickinson em voz alta ao atravessar uma rua movimentada. Inicia-se uma trama detetivesca. Depois de sua morte ela recebe um misterioso exemplar de A Linha da Sombra de Joseph Conrad vindo do Uruguai e salpicado de cimento.
A Casa de Papel fala de livros que mudaram destinos, como Sidarta, os de Hemingway, Dumas, Balzac, Faulkner. E lembraríamos Lobato, Zweig, Amado, Clarice, Borges, Mishima, e tantos outros encantadores de palavras.
A pequena obra nos reporta à Buenos Aires, paraíso de livrarias, e à magnífica Avenida Santas Fé com seus cafés e à majestosa Ateneu onde se pode perder de felicidade em meio a tantos livros, tanta vida e tanta história.
Fala também de Piglia, outro argentino, e de Borges, bússola moderna dos que lêem e escrevem. E da desordem dos apaixonados por livros, prateleiras repletas e poeirentas, da falta de espaço, de tempo e de dinheiro para se transformar no leitor que se sonhou ser.
Assim é a Casa de Papel que um dia cada leitor construirá feita de livros, sonhos e esperança, onde o leitor acaba por se transformar em escritor, e este em autor. Onde o homem solitário se encontra nos livros, decifrando sua vida nas palavras, naqueles mágicos objetos um sentido, como o Quixote, para quem a vida seguira um roteiro de livros lidos, ou Hamlet, que entra em cena lendo um misterioso livro, ou fingindo que lia, ou como o poeta Chinês Yan Tsen-tsai, que na noite fria, absorto na leitura de seu livro, esqueceu-se da hora de deitar e da bela companheira de leito que dominando sua ira lhe perguntou: Sabe que horas são?, no poema que Kafka copia e envia para a amada secretária Felice Bauer.
Mas qual poema misterioso estaria Bluma Lennon lendo ao ser atropelada?
“A palavra é morta quando é dita, alguns dizem. Eu digo que ela começa a viver naquele dia”.
Com este poema simples, a introspectiva Emily atravessa o tempo e atinge os corações e as mentes reflexivas.
O que é a palavra? Ela vive? Ela morre? Sobrevive a quem a pronunciou? Qual mistério a envolve e substancia? Qual a sua força?
O mistério da palavra é o mistério do pensamento. Ela é a expressão física deste e pode desaparecer. Ele não. O pensamento pode cruzar o espaço e o tempo e sobreviver como espírito, como chama, como sopro. Desaparece o som, a voz, fica o sentimento, o sentido, a raiz, a intenção, a emoção.
Assim é o homem-voz, expressão de um pensamento maior, anterior ao som e à palavra, misterioso arquiteto e habitante de uma Casa de Papel repleta de livros, histórias, idéias, biblioteca formada que é toda uma vida, muito mais que uma soma de momentos soltos.
Nagib Anderáos Neto
www.nagibanderaos.com.br
neto.nagib@gmail.com
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